Tira uma foto da minha saudade?

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Ainda não inventaram tática para prorrogar a juventude que afaste de mim o espanto dos “eu comprei esse disco na época do lançamento, há 15 anos”, “pois é, aconteceu no Natal de 1994, acredita? 26 anos já”

Vinte e seis anos. Vários dos meus alunos não chegaram à metade desse número em idade e eu sinto saudades que começaram lá atrás e não têm hora para acabar.

1994 é parte de uma década em que nossas recordações dependiam dos filmes fotográficos de 12, 24 ,36 ou no máximo 48 poses. Se hoje em dia tentamos 100 fotos para escolher uma melhorzinha, na adolescência da turma de mais de 30 anos tirávamos várias sem chance de ver o resultado no mesmo momento, torcendo para que sobrevivessem intactas à revelação pela qual esperávamos às vezes mais de 24 horas.

Habitantes do século XXI, já agradeceram pelos seus celulares hoje?

Meu pai acharia minha pergunta um desaforo: ele não tem celular, talvez pense que Whatsapp lembra nome de comida japonesa e quando vê alguém a postos segurando um telefone para fotografar alguma ocasião, logo manda sua famosa fala:

“Não gosto de foto digital, não dá pra fazer álbum “

Ele já revelou algumas fotos para presentear, mas seus olhos não perdem a fagulha de saudade.

Errado não tá.

Voltem comigo para 1994, quando meu pai fez 50 anos e ganhou uma festa surpresa com direito a presente para a família toda.

Nunca adotáramos um cachorrinho até a Chica, uma basset trabalhada no charme aparecer na nossa garagem no dia 24 de dezembro (sim, papai faz aniversário na véspera do Natal), atraída pela algazarra dos meus na época priminhos.

Serelepeando ela entrou e ficou nas nossas rotinas até 2010, ao descansar e deixar como pequeno e alegre legado sua filhotinha Luna e a presença passeadeira pelos álbuns de foto guardados no closet dos meus pais, vejam só.

Depois da vez da Luna partir restou na casa deles um quintal mais vazio, gelado e sem graça. Os dois decidiram não adotar mais nenhum bichinho. Somente depois de mudar para meu próprio lar abri o coração para outro serzinho peludo, agora uma gatinha, a Sabrina.

Sigo apaixonada pelos Daschunds, mas vocês já viram alguém substituir um familiar que se vai?

Para chateação felina da Sabrina acho que em 2 anos juntei mais fotos dela do que nos 18 que dividi com a Chica e os 16 em que me diverti com a doçura da Luna. Flagras de seus cochilos e caras de brava estão espalhados pelas minhas redes sociais e dariam um trabalho danado para serem compiladas em um álbum. Mas confesso que morro de medo de que meu telefone me largue na mão.

A relação tênue entre as diferenças no nosso jeito de recordar saltou aos meus olhos durante alguns momentos que reservei para limpar a memória da câmera do meu telefone. A cada imagem de grupos de Whatsapp, dois ou três closes da Sabrina que temo apagar por engano.

Em cima da minha gaveta de maquiagem coloquei a foto da Chica que peguei emprestada/ roubada da casa de meus pais, tirada no dia em que a gente se conheceu.

Não trocaria megapixels pelos flashs barulhentos dos colossos fotográficos da minha criancice, mas preservar os momentos que eles eternizaram é carinho que resiste ao tempo e às piadas com o conservadorismo no bom sentido do meu pai.

Embora minha mãe diga que minha memória é boa, um carinho nela não seria nada antiquado. Talvez eu precise de álbuns de fotos pela casa.

Sabrina, me aguarde

DéboraSConsiglio

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