Quando eu tinha uns doze anos frequentava a casa de um amigo da escola onde moravam umas quinze pessoas. Além dele e dos pais, tinha suas irmãs mais velhas, já com seus filhos e maridos, fora um tio e um primo da sua mãe. Era uma casa ampla e bem arrumada, não parecia que faltava recursos. Como eu estava acostumado a conviver apenas com outras quatro pessoas (e dois cachorros) na minha casa, me sentia num episódio da série “Mundo da Lua” da TV Cultura, diante daquele universo onde pipocava parente de todos os cômodos.
Certo dia esse amigo apareceu com um dinheiro que ganhou do pai para comprar uma caixa de bombons, porém estava em dúvida em relação à marca. Quando me perguntou o que devia fazer não hesitei em aconselhar a compra da que tinha o chocolate que eu mais gostava, pensando na minha recompensa pela ajuda tão providencial… Mas, além dele optar por outra, me deu o bombom de banana (aquele mesmo que ficava por último na caixa)! Lembro que fiquei frustrado e arrependido, afinal se ele já sabia o que queria por que perguntou?
Nessa mesma época, toda criança que via o desenho do He-man, no final era presenteada com um conselho, ao melhor estilo “moral da história”. Talvez por isso aconselhei meu amigo de forma tão natural. Até hoje circula por aí os trechos do desenho em vídeo ou em forma de memes.
Mas se os conselhos raramente funcionam, por que é tão irresistível essa vontade de dizer o que o outro deve fazer?
Como bem disse o pai da Psicanálise Sigmund Freud, “o conselho é uma forma de confissão”. Em várias ocasiões em que mediei reuniões de grupos, percebi que algumas pessoas se sentiam desconfortáveis ao ouvir conselhos dos outros participantes, mas na primeira oportunidade não pestanejavam em aconselhar também, muitas vezes da mesma forma, com as mesmas palavras. O conselho é mais funcional para quem dá, porque na maioria das vezes é uma projeção dos seus sentimentos e conflitos internos.
Atualmente também vivemos um fenômeno nas redes sociais que é a obrigação de ter opinião sobre tudo ou a necessidade de tecer comentários. Será que a culpa é do He-man?
Outro dia vi uma postagem do multi-artista Oswaldo Montenegro contando que seu pai o aconselhava a não dar conselhos: “nunca dê conselho sem que te peçam e mesmo que alguém te peça, hesite Oswaldo”. Em seguida ele quebra a diretriz dada pelo patriarca e afirma: “canta, dança, escreve, pinta, toca, não importa se faz isso bem ou mal, a arte desabafa e salva… Mas não dê conselhos”!
Sei que muitas vezes o que o outro precisa parece tão óbvio que é impossível ficar quieto. Mas vou evocar outro mestre da Psicologia, o Carl Rogers, quando determinou que todas as pessoas são movidas por uma tendência inerente para desenvolver todas as suas potencialidades. Ou seja, cada um sabe o que é melhor para si.
Então, quando alguém pedir um conselho ou vier aquela coceira para dizer o óbvio a um amigo ou parente, respire fundo, olhe bem nos olhos dessa pessoa e pergunte: “Como você se sente em relação a isso”? Já é uma grande ajuda e sem julgamentos, que é melhor ainda.
Pois é, acabei dando um conselho, foi mais forte do que eu…