Nove de Julho é feriado apenas no Estado de São Paulo e somente desde 1997. E muitos ainda não fazem ideia do motivo. Afinal, o que foi a Revolução Constitucionalista de 1932?
Foi um movimento armado, que resultou da revolta generalizada no Estado de São Paulo contra o governo de Getúlio Vargas, que assumira o poder em 1930 com um golpe de Estado, derrubando o então presidente Washington Luís e impedindo a posse de seu sucessor.
Vargas reduziu a autonomia dos Estados do país e indicava interventores para governá-los segundo seus interesses.
Com o apoio de grupos econômicos e políticos locais, o levante – que resultou no maior conflito militar do país no século 20 – teve início no dia 9 de julho de 1932, e terminou com a rendição do Exército Constitucionalista em 2 de outubro.
Seu estopim foram as mortes de quatro jovens paulistas por tropas getulistas durante uma manifestação no centro de São Paulo, no dia 23 de maio.
Os confrontos entre constitucionalistas e tropas enviadas por Getúlio – que conseguiu articular uma resposta militar com apoio de todos os Estados, exceto o Mato Grosso -, no interior do Estado e na capital, deixaram 934 mortos, entre eles, 634 constitucionalistas.
Legado
Historiadores pintam um quadro de “vitória após a derrota” ao analisar o legado o movimento.
“Em termos de curto prazo, foi a conquista de todas as bandeiras pelas quais o Estado se bateu em 1932”, aponta o jornalista Luiz Octavio de Lima, autor de 1932: São Paulo Em Chamas. “O governo getulista convocou uma Assembleia Constituinte, o Congresso foi reaberto, e foram convocadas eleições gerais.”
Como legado de longo prazo, ele aponta para “a valorização dos preceitos democráticos e a participação popular. O conceito de cidadania, assim como a vigilância mais próxima de governados sobre governantes.”
O historiador Paulo Rezzutti vê fortes razões para explicar as celebrações de 9 de Julho, “porque um Estado se levantou em armas por uma Constituição e conseguiu, mesmo perdendo a revolução, que a Constituição fosse convocada”.
“Só isso já deveria ser comemorado. A Revolução de 1932 foi, em parte, uma amostra do que o poder desse Estado era capaz de fazer se ignorado.”
Rezutti também acha que o episódio não teve o destaque que merece na historiografia do país do século 20. “Precisamos recordar que o governo de Getúlio Vargas, contra quem foi feito o levante, perdurou ainda por 13 anos, o que fez com que o assunto Revolução Constitucionalista não pudesse ser mencionado na imprensa, discutido nas tribunas políticas ou ensinado nas escolas”, pontua o jornalista.
“A narrativa dessa guerra civil foi encampada pelos vencedores e durante muito tempo prevaleceram teses como a de que o movimento teve um cunho separatista e antinacional, que São Paulo desprezava o restante do país, etc, quando, na verdade, a revolta nem havia sido estritamente paulista na sua origem, tendo obtido apoios no Sul, no Mato Grosso, em partes de Minas Gerais, Bahia e Amazonas”, explica.
“Também dizia-se que era motivada por um desejo da elite cafeicultora e industrial de São Paulo de recuperar privilégios perdidos após a Revolução de 1930, teoricamente de inspiração mais popular. Esses fatores tornaram o episódio distante do interesse de parte dos acadêmicos. Mas a partir dos anos de 1980 esses conceitos começaram a ser revistos.”
Para o pesquisador e colecionador Ricardo Della Rosa, que é neto de combatentes e mantém a página no Facebook ‘Tudo Por São Paulo’, dedicada ao tema, “a Revolução mostrou que é possível lutar por uma causa e, ainda que não tenham vencido no campo de batalha, os paulistas se uniram até as últimas consequências. E foram em frente. Em um curto período de tempo, produziram armas, chegaram a cunhar uma moeda própria, enfim, em três meses, fizeram mais do que em anos. A tristeza é que esse legado acabou não sendo passado em lugar algum, não virou matéria escolar, nada… É um período quase omitido em nossa história.”