Dois Olhares Sobre o Fim do Mundo

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O Que Realmente Importa?

Há mais de cinquenta anos, Assis Valente compôs um samba sobre o fim do mundo que continua muito atual. Porque se em 2012 “anunciaram e garantiram que o mundo ia se acabar”, em 2013 a questão parece superada, pois “o tal do mundo não se acabou”! Tudo certo, não fosse a minha eterna parceria com o atraso.

Tal “aliança” me fez aposentar o uso do relógio como adorno (menos uma contradição na vida!), além de ser tema recorrente de advertências dos mais íntimos, dizendo que pertenço à outra forma de tempo, como um personagem da série Star Trek!

Bem ou mal, o fato é que na minha “cronologia cinéfila”, os filmes apocalípticos lançados na crista da onda dos rumores sobre o Calendário Maia, estão entrando em cartaz somente agora. Entre tantos, acabei assistindo no mesmo fim de semana “4:44 – O Fim do Mundo” do Abel Ferrara e “Procura-se um Amigo para o fim do Mundo” de Lorene Scafaria.

No primeiro, a abordagem é minimalista. Acompanhamos os últimos instantes da humanidade de dentro do apartamento do casal Cisco e Skye (Willem Dafoe e Shanyn Leigh), numa Nova Iorque lúgubre. A intimidade dos personagens é exposta com crueza. Um filme adulto, onde a ironia não tem graça e a dura realidade é irreversível. Na total falta de sentido das coisas, da tela pintada por Skye à pontualidade do fim (4:44 da manhã – eu morreria atrasado com certeza!) é a proximidade, o vínculo que alivia o sofrimento.

No segundo, o título já demonstra mais leveza. Também trata o tema de forma adulta, porém com o olhar um pouco diferente. Os personagens principais Dodge e Penny (Steve Carell e Keira Knightley) se conhecem pelo mesmo acaso que colocou um meteoro em rota de colisão com a Terra. Juntos partem em busca de algo que dê sentido àquela situação. Ao contrário de “4:44…”, trata-se de um “roadie movie” onde a narrativa é construída na relação dos personagens com o mundo e não com suas intimidades. Obviamente, a falta de sentido e a urgência também movem suas ações, mas aqui além do vínculo, a apreciação das coisas simples da vida também ameniza o indesejado desfecho.

De fato, o assunto “fim do mundo” deixou as pautas das mídias há algum tempo e não faz o menor sentido para a grande maioria das pessoas. Atolados no cotidiano, nossos significados são destinados a coisas práticas. Apocalipse é perder o celular, queimar a placa mãe do computador ou arrebentar a correia dentada do carro. Apressados, estamos sempre atentos ao que menos importa com a convicção de que somos “highlanders” preparados para resolver tudo depois da novela ou do futebol.

Por mero exercício hipotético, suponhamos que assim como no filme do Abel Ferrara, uma celebridade com a credibilidade de um Al Gore anunciasse a nossa derradeira hora ou então que fôssemos convencidos como o personagem do Steve Carell, que o nosso destino está mais para Titanic do que para Arca de Noé. O que faríamos com o resto de nossas vidas?

Gosto da ideia da música “Todo Dia é o Fim do Mundo” do Lula Queiroga. No cotidiano do apocalipse, todo dia tem que respirar mais fundo. A cada volta do ponteiro uma vida nova e a cada instante uma nova possibilidade de se dedicar ao que realmente importa… E para os íntimos advirto: Não, isso não é ficção científica! Não estou falando de outra forma de tempo!

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